#episódioanterior
Tocado pelo carinho de Socorro, o menino Luan tenta descolar o que a tornava tão dedicada e sua insistência lhe arranca lágrimas. A enfermeira lhe conta a história mais triste que ele já ouvira sobre um garoto atropelado na porta de casa.
Acompanhe a minissérie » EP 01 • EP 02 • EP 03 • EP 04 • EP 05 • EP 06 • EP 07 • EP 08 • EP 09 • EP 10 • EP 11 • EP 12 • EP 13 • EP 14 • EP 15 • EP 16 • EP 17 • EP 18 • EP 19 • EP 20 • EP 21
Acordando de uma vez, com a sensação que a haviam tentado afogar até fazê-la perder os sentidos, Lourdes puxou o máximo de oxigênio possível. Endireitando o dorso, percebeu-se deitada, a visão turva não deixou compreender onde se encontrava. Olhando em volta, sombras estranhas se moveram a assustando; a sensação de estar perdida a fez acreditar que nada daquilo era real, se tratava apenas um sonho ruim.
Conforme a visão estabilizou, deu pra ver que aquele lugar em nada tinha a ver com seu quarto, ela não fazia a ideia alguma de onde estava, nem como foi parar ali, a luz apagada também não ajudou a esclarecer coisa alguma.
Mesmo com a mente lerda achou melhor sair do que quer que fosse aquilo, ao escorregar pro chão algo preso no braço a fez perder o equilíbrio, como as pernas ainda estavam fracas acabou caindo. Graças ao sensor de movimentos bruscos, logo uma enfermeira, acompanhada de dois auxiliares fortes, surgiu acendendo a luz. Após ser colocada de volta no leito, o cateter foi removido e pediram pra se acalmar porque precisava repousar.
— Você teve um mal súbito. – Alessandra, a enfermeira, informou.
— Como assim? – Espantada olhou em na direção dela, sem nem conseguir piscar.
“O verdadeiro amigo sempre está ao alcance do coração.”
Alessandra explicou que quando foi encontrada, ela estava fraca e inconsciente, suspeitando ser queda de pressão a aferiram, como estava tudo nos padrões conversaram com Marcos que sinalizou que ela não tomara café.
— Foi um grave quadro de hipoglicemia! – Kevin, um dos paramédicos identificou. Antes dela entrar em coma, os socorristas lhe aplicaram uma dose de glicose, estabilizando seu quadro. Como permaneceu desmaiada, ao dar entrada no hospital, foram feitas mais administrações de glicose até ela acordar.
— Meu filho! – As palavras saíram, num volume que não conseguiu controlar. Sua memória estava turva, até Alessandra começar a falar, então uma violenta descarga elétrica caiu sobre si formando círculos excêntricos pelo chão, seu cérebro – que congelara devido ao choque – voltou a funcionar numa capacidade superior, fazendo-a processar todas as conexões possíveis de uma só vez. No mesmo instante, entra Marcos no quarto de semblante obscuro, a deixando mais agitada.
— Amor, cadê nosso filho? Onde o Cadu tá? – Os olhos suplicavam.
— Melhor você se acalmar, querida…
— Me acalmar por quê? – Ela interrompeu. – O que aconteceu com nosso filho? – O marido que pareceu querer falar, mas algo o impedia, sem aguentar a firmeza de seu olhar, ele desviou na direção da enfermeira que balançou a cabeça em negativa. O gesto rápido foi notado e quando Marcos olhou de volta, ela nem esperou pelo que ele diria. – Antônio Marcos Mendes, o que você tá escondendo? – A aflição a consumia.
Apesar de exigir uma explicação, teve como resposta apenas o olhar carregado de dor de esposo e o de pena dos demais dispensando qualquer palavra. Aquilo lhe encheu os olhos de lágrimas e a alma de amargor, a ponto da língua azedar prendendo na boca.
— Meu… meu filho morreu! – Ficou difícil falar até que começou a gritar histérica, sem o perceber. – Meu D-s! Meu Cadu tá morto e eu vi! Eu vi tudo!
— Dona Lourdes, por favor, se acalme! – Alessandra pediu gentil, mas firme.
— Não! Mataram meu filho! Preciso ver ele! – Ela levantou bruscamente, empurrando a enfermeira. Os auxiliares foram em sua direção e a seguraram, mas diferentemente da forma débil e fragilizada que chegou, Lourdes ofereceu mais resistência do que seu corpo parecia possuir, tanto que foi preciso da ajuda de Marcos pra contê-la.
Isso lhe aumentou o desespero e Lourdes começou dissociar o que dizia, o olhar foi ficando vago, enquanto ela repetia as palavras “filho” e “morto”, com uma lacuna entre ambas, até virarem gemidos. Quando a soltaram seu corpo dava espasmos, a enfermeira lhe iluminou os olhos, mas eles não interagiram com a luz.
“A grandeza habita em nós, independente da fragilidade da aparência ou tamanho que se possa ter.”
— Ela está em estado catatônico! – Foi a constatação. Instantaneamente lhe aplicaram uma dose de benzodiazepínico, de curta duração, pra demovê-la daquela condição, enquanto o fármaco lhe proporcionava alívio.
Horas mais tarde, Lourdes desperta relaxada, envolvida por uma calmaria agradável que lhe tirara a capacidade de sentir dor, apesar da sensação boa aquilo era só efeito do que lhe foi injetado. Ao ser avisado que a esposa acordara e que sob o efeito do calmante o impacto da notícia seria menos doloroso, Marcos entrou, sentando ao lado de seu leito.
— Você tá melhor, querida? – Ela confirmou com um aceno. – Preciso contar algo… – Ele começou, mas se interrompeu, sem ideia de como falar de um jeito menos doloroso.
— Tudo bem, amor, pode dizer. – Ela incentivou, apesar de zonza precisava saber o que acontecera. Quando o esposo começou a falar, um manto negro tornou as lembranças da manhã ensolarada em escala de cinza, roubando cada tom de felicidade experimentada até restar apenas dor.
Marcos falava no celular, quando Cadu pediu pra adivinhar onde estava, depois chutar errado pra diversão do filho, o garoto disse estar “na frente”. As palavras foram interrompidas, por sons aterradores. Assustado, Marcos abriu a porta e viu os vizinhos, tão ou mais espantados que ele, aí chamou a esposa e correu pra fora.
— Espera, neguinho! Tinha vizinho do lado de fora? – Lourdes estava incrédula.
— Mais vizinho que gente, querida.
— Mas não vi ninguém quando saí! – Ela ficou confusa.
— Deve ser atenção seletiva, amor, porque estava todo mundo lá. – Ele respirou fundo. – Tudo que consegui fazer foi pegar o Cadu no braço, sem me importar com mais nada.
Sem conseguir ouvir som algum – mesmo com todo barulho em volta – Marcos seguiu levando Cadu com o corpo querendo tombar a cada passo dado. Perto de entrar, olhou pro pra trás e viu Lourdes desmaiar, daí ficou em completo desesperado.
Sem saber o que fazer, berrou, pedindo pelo amor de D-s, pra chamarem o SAMU. Na mesma hora Fábio e Beatriz, vizinhos da frente e amigos dos Mendes que voltavam do fim de semana na fazenda, chegou. O amigo botou ordem na geral, composta por curiosos, alguns sem reação e os sem-noção, que queriam registrar tudo. Fábio pediu pra Bia e mais alguns socorrer Lourdes e acudiu Marcos, enquanto chamava os paramédicos.
— Graças à D-s que a gente tem os Soares pra ajudar. – Lourdes estava aliviada.
— Pois é, amor, eles apareceram na hora certa!
Marcos ainda estava surpreso com tamanha coincidência, não que os outros vizinhos fossem maus, mas nada como ter amigos tão chegados [Provérbios 18.24] – o verdadeiro amigo sempre está ao alcance do coração.
— E o Cadu, sobreviveu? – As lágrimas escorriam serenas pelo rosto de Lourdes.
— Querida, calma! – Ele enxugou seus olhos com os polegares e lhe beijou a fronte. – O Cadu tá vivo. – Marcos sorriu tímido.
— Ah! Graças à D-s! – Ela respirou, aliviada.
— Só que a gente não vai conseguir ver ele agora.
— Por que não, amor? – Lourdes franziu a testa.
— Antes você precisa se recuperar, descansa um pouco mais! Você passou por fortes emoções hoje, depois que acordar a gente fala com o doutor.
— Tudo bem. – Obediente, devido ao calmante, se aninhou no leito, Marcos a cobriu, lhe beijou o rosto e apagando a luz a deixou. Graças ao ansiolítico, ela estava mais calma, até porque ele não contou todos os detalhes e manteria assim enquanto pudesse.
Sua companheira sofrera demais e podia não estar pronta pro que estava por vir. Nem ele sabia como lidava com tudo aquilo, a única resposta é que aquela força maior que ele próprio só podia vir de D-s [Salmos 46.1]. Mesmo sabendo o que acontecia naquele momento, Marcos sorriu – a grandeza habita em nós, independente da fragilidade da aparência ou tamanho que se possa ter [1 Coríntios 6.19].
— Acorda, querida, precisamos ir. – Horas depois Marcos voltou; sem querer acordá-la, sussurrou.
— Já? Deixa eu dormir um pouco mais. – Ela ressonou, ainda sob efeito do ansiolítico.
— A gente precisa falar com o médico. – Ele lembrou, com suavidade. Mal Marcou fechou a boca e a esposa deu um pulo, espantando a sonolência pra longe dali e o deixando assustado pela repentina mudança de disposição.
— Tá esperando o que, neguinho? Vamos ver o Cadu! – Ela foi em direção a porta, concordando que o marido tinha razão, o descanso a deixara revigorada.
— Espera, querida! – Marcos a segurou e respirou fundo.
— Que foi, amor? – Ela estranhou a calma do marido.
— É que, talvez, a gente não consiga ver o Cadu hoje ainda.
— Que isso, Marcos? – Lourdes ficou séria diante do despautério da sugestão.
— O Cadu tá na UTI.
— Ah! Então a gente fazer uma visitinha rápida. – Ela riu. Ao perceber o olhar sofrido do marido, o sorriso sumiu. – Tem mais alguma coisa que preciso saber?
— Por enquanto é só. – Ele tentou ser o mais contido possível, o que teve o efeito contrário.
— Neguinho, não adianta esconder, se eu descobrir depois vai ser pior. – Pensativo, ele desviou os olhos dela fixando-os no chão. – Não faz assim, o que quer que tenha acontecido, o Cadu também é meu filho. Preciso saber como ele tá, neguinho.
— Querida… – Marcos a encarou. – Melhor falar com o médico, ele tá esperando a gente.
— Tudo bem! – Sem alternativas, Lourdes assentiu. – Com a resposta, Marcos se adiantou abrindo a porta pra esposa e os dois foram de mãos dadas, rumo à sala de doutor Pedro Gonzaga, o médico que os assistia.
Se Lourdes estava apreensiva, a sensação intensificou após a porta da sala do médico ser aberta por um alguém alto e jovem demais, ou seja, pouco experiente, além disso, era barbudo, algo que ela não gostava, aquele monte de pelo na cara não lhe inspirava confiança. Ainda assim, entrou pra saber o que o sujeito tinha a dizer.
— Por favor, se sente, dona Lourdes.
— Obrigada, tô bem assim! – Ela permaneceu séria e em pé. – Quero ver logo meu filho.
— Receio que isso não será possível.
— O quê!? – Ela se indignou, aquele médico não podia fazer isso. Com a idade que tinha nem devia saber o que falava.
— Melhor a senhora se sentar, o que irá ouvir pode não ser fácil de digerir. – No mesmo instante o olho de Lourdes brilhou, querendo se desfazer em lágrimas, respirando fundo ela tentou se acomodar na cadeira fria, sem saber que estava prestes a receber a pior notícia de sua vida. – Dona Lourdes, o Cadu tá em coma.
— Meu D-s! Como assim, doutor? – Ouvir aquilo foi o mesmo que uma faca lhe perfurar de um extremo ao outro. Olhando em direção ao marido, o viu de mãos cruzadas sobre a mesa com um olhar sério que a atravessou a alma, fazendo-a emudecer.
“Então era isso que o Marcos sabia e não quis me falar…” – Com a respiração pesada tentou conter a enxurrada de emoções, enquanto voltava a encarar o médico.
#proximoepisodio
A conversa com o médico abala Lourdes e ao invés de se desesperar ela busca forças em D-s. Devido o assédio dos repórteres, o casal não volta pra casa e quando retornam ao hospital ela descobre que o marido andou lhe contando mentiras.
Conheça a história com acontecimentos inéditos e um episódio extra!
Ósculos e amplexos,
Autor de Interrompido – A curva no vale da sombra da morte, é um cara apaixonado total por música, se deixar não faz nada sem uma boa trilha sonora. Bota em suas histórias um pouco de seus amores e do que sua visão inversível o permite enxergar da vida.