Interrompido – Entrevista com o vampiro (Episódio 06)

Interrompido – Entrevista com o vampiro (Episódio 06)

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Apesar do processo de recuperação de Cadu seguir acelerado, o garoto permanece desacordado, ao pressionar o médico, Lourdes descobre que o filho está coma e a notícias a deixa terrificada e revoltada por isso lhe ser escondido.

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O choque de ser enganada pelo próprio marido – companheiro de um vida, presente tanto nos momentos bons, quanto nos ruins – fez Lourdes se perder entre decepção, traição, tristeza e dor que se fundiram numa bola e lhe socaram o estômago até subir a garganta, onde ficou presa a deixando sem saber como reagir. Como Marcos nunca deu motivos pra haver dúvidas quanto a própria integridade, ela jamais esperou nada assim do marido, o que facilitou ser enganada com facilidade.

Uma sensação ruim lhe apertou o peito e doeu mais a medida que se deu conta que se o marido fizera uma coisa daquelas, mesmo sabendo o quanto era importante ela saber o real estado do filho, podia fazer qualquer coisa.

“Será que posso mesmo confiar no Marcos?” – A dúvida lhe arrepiou a espinha. Se a tivesse traído a dor seria menos intensa que aquela a lhe consumir.

— Dona Lourdes, quando não é possível lidar com todos os fatos sobre a verdade, omissão implica em cuidado. – Doutor Pedro Gonzaga disse antes dela explodir em palavras que a machucariam mais que a Marcos. A reflexão removeu de si uma enxurrada de pensamentos ruins a apontar pra uma separação conjugal, a fazendo ver o esposo com um olhar de carinho pelo zelo em ocultar coisas que sabiam serem necessárias.

“Quando não é possível lidar com todos os fatos sobre a verdade, omissão implica em cuidado.”

— Me perdoa, amor! – Ela lhe segurou as mãos, enquanto um fio cristalino fazia um caminho aleatório por seu rosto.

— Tudo bem, querida. – Sereno Marcos esboçou um sorriso cansado, sem qualquer marca de mágoa. Então lhe envolveu nos braços, fazendo-a experimentar paz; felicidade consiste em várias doses de perdão e um bocado de amnésia. Ele sabia: tudo que a esposa precisava era amor [1 Coríntios 13.4-7] e o ofereceu num abraço apertado.

— Doutor, porque a gente teve que esperar o senhor chegar pra ver o Cadu? – Agora Lourdes estava mais calma.

Aproveitando o ambiente carregado de uma sensação boa, doutor Pedro disse que foi utilizado o coma induzido pra evitar dor ou desconforto em Cadu e permitir ao organismo dele poupar energia pra se recuperar mais rápido; só que mesmo após interromper a administração dos remédios ele não despertou.

— A gente não sabe quando isso vai acontecer, mas o Cadu está sendo monitorado e recebendo todos os cuidados necessários. Não há com o que se preocupar.

— Mesmo? Então, porque ele não acorda?

— O organismo dele está levando mais tempo que o necessário pra metabolizar a medicação.

— Se isso podia acontecer, por que vocês colocaram ele em coma?

— Porque o risco da sedação era menor que operá-lo naquele estado, até porque coma induzido não deixa sequelas. – O médico garantiu. – Devido à gravidade das lesões há uma chance de tetraplegia, porém, dependendo da velocidade de cura do organismo do Cadu a recuperação dos movimentos pode ser parcial ou mesmo completa.

Pra um prognóstico exato seriam necessários exames mais detalhados, que ocorreriam quando o garoto acordasse. Ainda que o resultado fosse negativo ele receberia acompanhamento e suporte dos melhores profissionais pra manter a própria independência enquanto ocorresse a readaptação.

“Felicidade consiste em várias doses de perdão e um bocado de amnésia.”

— Apesar disso, estou otimista que ele despertará logo.

— Preciso ver meu filho, agora! – Lourdes estava aflita.

— A senhora não quer um esperar um pouco mais, dona Lourdes?

— E quanto tempo seria? – Ele ficou desconfiada.

— Só mais alguns dias.

— Doutor, preciso ver meu filho agora. – A calma era tanta que até ela se espantou. Doutor Pedro Gonzaga olhou pra Marcos de soslaio que assentiu com a cabeça.

— Vamos, então? – Lourdes nem esperou o médico terminar e já estava em pé. – Devo alertar que mesmo que não pareça o estado dele está melhor.

— Tudo bem, tô preparada! Só preciso ver meu filho.

— Me acompanhem, por favor! – Doutor Padro Gonzaga seguiu pelo corredor com os pais atrás. Marcos que acompanhara Cadu permaneceu sério, já Lourdes não conseguia esconder a felicidade em poder vê-lo. Cada passo aumentava o calor no peito, provocando um sorriso que se espalhava nos olhos fazendo eles brilharem.

Eles pegaram o elevador e subiram um, dois, três, quatro, cinco, seis andares, quando Lourdes pensou irem continuar nessa até chegar ao topo do prédio, a cabine parou e as portas se abriram; empolgada, ela saiu apressada, mas Marcos a puxou pro lado contrário e eles caminharam até o quinto quarto.

“Prosperidade não se resume a riquezas ou posses, mas aos momentos passados com quem nos faz feliz.”

Um vidro na parede antevia a visão de seu interior, conforme Lourdes se aproximou o coração foi na boca; ela nunca estivera nervosa assim, nem no dia do casamento. Quando seus olhos captaram um corpo inerte, com bandagens e gesso nos braços e pernas, de rosto inchado, seu sorriso se perdeu numa face sem expressão. A múmia ali em nada lembrava o garoto atlético, sucesso com as garotas, não podia ser Cadu, ele saíra de casa todo arrumadinho e cheiroso.

Com os olhos carregados de dor, virou na direção do marido e o rosto impassível dele a fez perceber não estarem no quarto errado, deixando-a estarrecida. Só aí ela percebeu não estar pronta coisa nenhuma pra ver o filho daquele jeito – não ainda. Vacilando, se apoiou em Marcos.

— Você tá bem, querida? – Ele a segurou, preocupado que ela desmaiasse ali.

— Sim, só preciso de um pouco de ar. – Lourdes respirou fundo, se apoiando no esposo.

Do lado de fora, ele a ajudou a sentar no banco de pedra, próximo à entrada principal, e questionou se ela se sentia melhor, após um demorado suspiro a esposa afirmou que sim.

— Por isso não te contei do estado real do Cadu, querida! Sabia que não ia te fazer bem.

— Tudo bem, neguinho, foi só um susto. – Ela olhou o relógio. – Melhor você ir, se não vai se atrasar.

— Certeza que você tá bem? – Marcos olhou fundo em seus olhos.

— Sim, pode ir! A gente se encontra em casa. – Ela sorriu. – Trabalhador amigo. – Lourdes puxou.

— Na paz e no perigo! – Marcos continuou.

— Jesus está contigo! – Ela concluiu o versinho. A benção em forma de saudação era repetida toda vez que Marcos ia trabalhar, um costume que eles nem lembravam como começara e que o desejo de um dia próspero fazia as palavras saírem espontâneas.

Até logo amor

— Fica com D-s, querida! Até mais tarde. – E com um beijo ele se foi.

Lourdes não lembra o que aconteceu depois disso, apenas de acordar no hospital e receber soro. Doutor Pedro Gonzaga lhe disse que assim que Marcos partiu ela desmaiou, então os guardas a viram e a levaram pra emergência. O médico alertou que ela estava com hipoglicemia outra vez e Lourdes revelou que na pressa de ver o filho deu nem tempo de tomar o café da manhã.

— Aposto que a senhora também não comeu nada quando chegou ontem, acertei?

— Não, doutor! – Ela respondeu com um sorriso desconcertado.

— Dona Lourdes, compreendo sua agitação, mas se quer estar bem pra quando o Cadu acordar precisa se cuidar ou seu marido vai ter que lidar com duas internações. – As palavras lhe estapearam a cara, apesar da ardência o choque de realidade a deixou mais consciente e, reconhecendo que ele estava certo, agradeceu e se foi.

O coletivo fazia o trajeto de casa quando se aproximou da praça central, então Lourdes desceu pra espairecer. Se sentindo zonza pediu um dogão prensado pegando o mais completo, o cheiro surgido enquanto aguardava, a fez perceber o quanto estava faminta.

Aproveitando que aquela hora a praça estava vazia, com exceção de algumas pessoas fazendo cooper, escolheu o banco de pedra estratégico pra aproveitar o solzinho; embora fraco, seu calor agradável espantou a friagem, enquanto riscava o horizonte com tons alaranjados e rosáceos.

Sobre a grama aparada de um verde profundo, ela e seus meninos haviam feito piqueniques, jogado dominó tempos atrás. O chafariz no meio da praça era a diversão das crianças, ali Cadu entrava pra aliviar o calor. Mais à esquerda havia um coreto, onde acompanhavam as apresentações realizadas aos domingos.

Sem esperar, um pombo pousou aos seus pés, fazendo-a recordar uma das diversões prediletas de Cadu: perseguir os penosos. Vendo o bicho faminto foi jogar um pedaço de pão, aí se deu conta haver devorado todo o lanche.

— Desculpe! – Ela riu. – Acho que eu tava com mais fome que você, amiguinho. – O pássaro a olhou sem entender, virando a cabeça de um lado pro outro, até alguém fazendo cooper passar por eles e o pombo levantar voo.

Depois que Cadu cresceu eles voltaram poucas vezes, o filho vivia ocupado, o que restou foi a felicidade registrada nas fotos e recordações a fazendo entender que prosperidade não se resume a riquezas ou posses, mas aos momentos passados com quem nos faz feliz – quanto a isso havia motivos de sobra pra ser grata a D-s [1 Tessalonicenses 5.18] por uma família que a amava demais.

Passado um bom tempo em reflexões misturadas as lembranças o sol ardeu sinalizando ser hora de ir pra casa. Chegando lá, tudo estava como fora deixado, só que a mesa fartamente disposta não mais a atraía. Apesar de não gostar de desperdício, Lourdes se viu obrigada a jogar tudo fora; apenas o fato de vê-la lhe causava asco.

Por volta das cinco da tarde chega Marcos e quase não consegue entrar em casa, o lugar estava cercado pela imprensa, foi preciso desviar de vários repórteres avançando sobre si, todos querendo uma exclusiva. Ao entrar, apesar das luzes acesas não encontrou a esposa, então a chamou, sem resposta entrou na cozinha, a achando agachada, perto do fogão.

Até saiu procurando

Querendo saber o que acontecera, Lourdes explicou que viera pra casa descansar, mas quem disse que deu? Foi a imprensa saber e os repórteres chegaram querendo falar consigo, mesmo trancando portas e fechando janelas, eles continuaram incomodando, a obrigando desligar a campainha e o telefone, nem assim eles se desistiram; assustada e sem ter como os expulsar, ela se escondeu ali.

Pedindo pra esposa não se preocupar que daria jeito naquilo, Marcos saiu pela porta da frente, disposto a enfrentar toda aquela corja que se amontoou querendo ouvir o que ele tinha a dizer. Pouco depois ele retorna, o silêncio entregava que obtivera sucesso, mas encontrou a esposa sentada à mesa, com os olhos a verter transbordantes. Daí contou que pra dispersar o bando prometeu exclusiva pra uma das emissoras.

— Acho que não foi uma boa ideia, melhor cancelar a entrevista! – Marcos decidiu ao ver o estado de sua amada.

— Tudo bem, neguinho, precisamos falar. – A resposta o deixou surpreso, então ele convidou a equipe pra entrar e eles prepararam tudo.

A última coisa que Lourdes queria fazer naquele momento era aparecer diante das câmeras só pra relembrar o quanto tudo aquilo doía, ainda mais com o coração pesado como estava, porém, se viu obrigada a encarar a mídia que não os deixaria em paz até se pronunciarem e já que não tinha como escapar, aproveitaria pra trazer conscientização.

Vendo a esposa aflita, a soluçar e falando com dificuldade, Marcos se deu conta de seu erro. Ele ainda a puxou de lado, quando surgiu uma pausa, tentando a demover de continuar a se expor, mas ela resistiu, decidida a prosseguir com a entrevista.

Amanda Alves, a repórter conduzindo a entrevista, fazia as perguntas, enquanto Lourdes narrava os fatos, falando das dimensões que a dor lhes causara até ser questionada sobre o estado de Cadu. A pergunta a fez descontrolar a ponto de Marcos intervir pra retirá-la.

O resultado não saiu como planejara, além do desespero que a tomou ela só ficara na defensiva. Também, exaurida como estava e ainda ter de suportar que feridas recém-abertas fossem remexidas fez nada bem – a impressão foi a mesma de estar numa entrevista com o vampiro a lhe sugar até a alma.

— ISSO TUDO É CULPA DAQUELES INCONSEQUENTES! – Ela berrou enquanto era carregada pra cozinha.


#proximoepisodio

Toda barra que o casal enfrentava tinha um único responsável: Nandinho, que não parecia ter muito juízo e se tinha acabou o perdendo em meio a enxurrada de sensações e da ostentação exibia nas redes sociais pra seus seguidores curtirem.

Conheça a história com acontecimentos inéditos e um episódio extra!

Ósculos e amplexos,

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