Articulário: Basta de ser controlado pelo medo
Lukas Eggers/ Unsplash

Basta de ser controlado pelo medo

“Existem fantasmas que a gente só exorciza cara a cara.”

Mishael Mendes, Interrompido – A curva no vale da sombra da morte

Corram pras montanhas

Quando nos deparamos com algo assustador, a amígdala alerta o sistema nervoso liberando hormônios de estresse, como cortisol e adrenalina. Com isso, a frequência cardíaca aumenta acelerando a respiração e a pressão sanguínea se eleva nos botando no estado de luta ou fuga.

Por mais que fugir seja uma reação automática quando a gente se depara com o medo, existem coisas que exigem de nós mais que fôlego, força nas pernas e condicionamento físico: é preciso enfrentá-las pra deixarem de ter poder sobre nós e nossas emoções.

Presença do medo

Isso é importante, porque se deixar o medo crescer, ele pode distorcer até tomar uma forma apavorante, se transformando em fobia. E quando ele chega a esse estágio nos leva a ter medidas extremas mesmo com coisas e situações comuns. Como sentir a iminência da morte diante de uma barata voadora, ainda que seu tamanho seja menor e ela tenha mais medo da gente que nós dela – a diferença é que ela usa seu instinto pra atacar. Assim, toda vez que percebermos a presença do medo acabamos por sair de seu caminho pra evitar dores no peito, calafrio, boca seca, náusea, taquicardia; dificuldade de respirar, transpiração em excesso, tremor, dores de estômago e mãos suadas – isso se a gente não  perder o controle de vez e acabar surtando no desespero.

Se correr o bicho pega

Entramos na dualidade de escolha que parece não trazer vantagem em nenhum dos extremos, afinal, “se correr o bicho pega e se ficar o bicho come”. Assim, a lógica parece apontar pra prolongar o enfrentamento e continuar a fugir, mesmo que uma hora o bicho vá nos alcançar. Mas enquanto estamos nessa corrida insana, o medo cresce e vai espancando nosso corpo, com a síndrome do impostor, cansaço em excesso, além de nos deixar perturbados e roubar nosso autocontrole e confiança.

A real é: quanto mais fugimos mais mostramos ser presa fácil, com isso o medo fica forte e ousado suficiente pra avançar como um cão bravo, nos dominando e fazendo a gente pedir pra sair. Viver constantemente com medo, traz impactos negativos pra todas as áreas de nossas vidas e nos torna incapazes. Memórias a longo prazo podem sofrer danos, já que partes do cérebro como o hipocampo são afetadas. Nosso sistema imunológico é enfraquecido, podendo causar danos cardiovasculares, surgem problemas gastrointestinais, como gastrite, úlceras e síndrome do intestino irritável. Além da fertilidade ser reduzida, ainda pode levar ao envelhecimento acelerado e à morte prematura. Outra consequência massacrante do medo a longo prazo é a depressão.

Possessão

Como alerta a psicóloga clínica e Ph.D. Kari Astley Stephens, o problema é que o cérebro não dimensiona o medo, “assim ele reage a algo ruim como se fosse fatal”. Por isso, se ao perceber o medo se manifestar o interpretamos com negatividade e que não podemos lidar com ele, isso provoca estresse que pode levar a ansiedade e a paralisia – conforme você pode ver detalhado no poema “O medo que me paralisa“. Segundo Stephens, “a ansiedade é uma resposta emocional a algo que o cérebro acha perigoso, mas realmente não é”.

Não devemos deixar o medo nos deter, se ele insistir em permanecer, que seja um companheiro silencioso que nos cutuca pra lembrar de nossos limites. Uma forma eficaz de lidar com ele e tornar as coisas menos apavorantes é obtendo apoio social de pessoas que apoiam e acreditam em nós. Aquelas que não tiram sarro ou vantagem de nossas inseguranças, desejando nosso sucesso mais que nós mesmos.

A prática da atenção plena (mindfulness) que surgiu dos programas de redução de estresse de Kabat-Zinn, em 1982, também ajuda a estar consciente pra substituir pensamentos negativos por outros mais úteis. Como explicam Mark Williams e Danny Penman em “Atenção plena – Mindfulness: Como encontrar a paz em um mundo frenético” (“Mindfulness: a practical guide to finding peace in a frantic world”, de 2011). Além de técnicas de gerenciamento de estresse, como respiração profunda, relaxamento muscular progressivo e visualização, ter uma boa alimentação, praticar exercícios regulares e desfrutar de uma boa noite de sono também ajuda.

O portal do medo

Duncan Muguku nos lembra que o medo é uma passagem, cujo acesso controlamos: “superá-lo não é um evento único, é um processo onde, à medida que você desbloqueia um pequeno portão do medo, ganha confiança pra desbloquear um portão e mais outro; aumentando a confiança e se afastando de sua zona de conforto pra possibilidades mais altas.”

Enfrentar os fantasmas da mente pode ser a alternativa mais assustadora, mas com certeza liberta de um peso, às vezes esmagador, enquanto libera uma força bônus que só é possível descobrir caso a gente não atente pro tamanho do desconhecido e, sim, pra liberdade oculta atrás dele, a nos esperar derrotar a ameaça monstruosa.

Tem sabor de mel

É possível saborear o medo mesmo sem a adição de adoçantes, temperos, realçador de sabor – cujo uso pode ser perigoso – ou mesmo sem a fruta do milagre pra enganar seu gosto amargo. Pra isso precisamos refletir: o que de pior pode acontecer ao enfrentar o medo? Quais serão os benefícios do enfrentamento? O que acontecerá se não agirmos, vamos nos arrepender depois? Até onde chegamos da última vez que enfrentamos uma situação difícil, é possível ir além dessa vez?

Porém, eliminar os obstáculos que impedem de seguir adiante pode exigir um longo processo, mas ao identificar os gatilhos e barreiras ajuda a dar pequenos passos e agir de forma consistente. A primeira vez que enfrentamos o desconhecido é difícil, mas a medida que insistimos, o processo se torna menos doloroso e mais empoderador, como definiu Henry Ford: “uma das maiores descobertas que um homem faz, uma de suas grandes surpresas, é descobrir conseguir fazer o que temia não poder”.

Me dê sua força, medo

Ao contrário do que parece, o medo não serve pra nos tornar covardes, ele desencadeia um conjunto de respostas que nos protegem de ameaças a nossa integridade ou existência. Hormônios como adrenalina, dopamina, endorfina, ocitocina e serotonina são liberados causando uma série de reações pra ficarmos alerta e agir com mais eficiência. A frequência cardíaca e pressão aumentam, a respiração se eleva; os músculos ficam tensos e as mãos frias e úmidas, porque o sangue flui pra longe das bordas do corpo em direção aos músculos interiores maiores.

A reação ao medo começa na mente e se espalha pelo corpo, desviando todos os recursos pro corpo fazer os ajustes ideais pra podermos agir. Pode não ser tão legal quanto a transformação dos Cavaleiros do Zodíaco ou pesada como a do Goku, mas somos turbinados e recebemos uma carga extra de poder que faz nossos sentidos vibrar pura energia.

Medo é energia

As mudanças corporais que surgem servem pra aprimorar e nos tornar mais eficientes. O cérebro se torna hiperalerta pro que acontece ao redor, as pupilas dilatam pra vermos a ameaça com clareza. A frequência cardíaca e a pressão sanguínea aumentam acelerando a respiração e bombeando mais oxigênio e glicose pros músculos esqueléticos – os principais responsáveis pela ação. Enquanto isso, funções que não são importantes pra agirmos, como o sistema digestivo, são reduzidos ou desligados pra poupar energia.

Assim, com nossas faculdades perceptivas aguçadas, é possível agir de forma rápida, tomar decisões em menor tempo, promover conexões sociais e melhorar nossa lembrança de eventos importantes. Por isso, quando o medo surgir, devemos ser fortes e corajosos, sem temer ou desanimar [Josué 1.9]. Mesmo a situação parecendo assustadora, é preciso de forças pra agir, porque se vacilarmos na dificuldade, nossa força irá encolher [Provérbios 24.10] e a gente continuará no outro extremo das reações do medo: na fuga, sem nunca obter coragem suficiente pra vida, já que viver consiste em enfrentar o desconhecido a cada esquina.

Contextualizando

A frase que originou essa reflexão faz parte de “Interrompido – A curva no vale da sombra da morte“, uma minissérie que mostra que nossa humanidade é que nos leva a viver os desejos mais profundos e a cometer os erros mais insanos. Ela surge quando Luan se encontra sem conseguir descansar devido aos pesadelos que o atormentam, e a enfermeira lhe oferece um remédio pra ajudar a dormir. Mas ele dispensa sabendo que precisa encarar a realidade assustadora em que suas ações o colocaram.

Artigo publicado originalmente no LinkedIn, também está disponível no Medium.


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Ósculos e amplexos,

Mishael Mendes Assinatura
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