#episodioanterior
Depois de ser pego no flagra, Derry acabou perdendo o contato com Adie, mas muito aconteceu depois disso – e antes também – que o fizeram tomar a decisão que teve e que tanto chateou a garota.
Mas uma mensagem inesperada acaba por trazer boas notícias e perspectivas de novos começos. O arrependimento pode até não ter matado, mas será que vale a pena persistir no que machuca?
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Uma mensagem de número desconhecido havia chegado dias atrás, perguntando se era Derry, apesar da resposta ser afirmativa ele ainda não a tinha respondido, até chegou a visualizá-la, mas como não dava pra ver a foto e nem lembrava do contato deixou isso pra depois – nisso a semana se foi sem nem ser percebida.
Fazendo a limpa pra responder às mensagens ainda sem resposta, Derry acabou vendo novamente a do número desconhecido e resolveu mandar algo – vai que alguém tinha pego seu contato com um conhecido e precisava falar com ele?
— É o Derry, que pega?
Ele enviou isso e deixou pra lá, horas depois quando olhou a pessoa se quer tinha visualizado.
— Pelo jeito era nada de importante ou deixou de ser pela demora. – Ele deu um sorriso amarelo. – Ou a pessoa tá fazendo o mesmo comigo? Vai saber!
A noite, quando Derry deitou-se pra dormir e foi colocar o iPhone pra carregar, a resposta chegou.
— Finalmente te achei!
— Ué! Quem é?
— É o Deepak, o pai da Adie. A gente precisa de você!
— Nossa, mas o que foi, seu Deepak? – Derry ficou preocupado.
— É complicado explicar por mensagem.
— Quer que te ligue?
— Não, você precisa vir aqui!
— Tudo bem, como amanhã é sábado, passo aí logo depois do café.
— Derry, precisa ser agora!
“O silêncio pode esconder surpresas assustadores, até mesmo mortais.”
— Mas já passou da meia-noite!
— Sei disso, mas a coisa é séria.
— Poxa, não tem como ir amanhã? Posso sair mais cedo.
— Desculpe a insistência, mas tem que ser agora. Você vai entender quando chegar aqui.
— Tá bem, já vô! – Derry afastou as persianas, só pra ver a densidade da escuridão, algo que não lhe agradou nada, mas assustado com a possibilidade do que podia ser tão urgente pra Deepak insistir em vê-lo, resolveu ir.
Na pressa, botou apenas um roupão por cima do pijama, entrou no carro e se foi.
A noite estava fria e lúgubre, a lua se escondia entre negras nuvens que absorviam quase que totalmente o brilho dela, deixando um clima meio sinistro, como se algo estivesse fora do lugar ou que algo inadequado se formava nas sombras, antevendo o mal que podia surgir na próxima esquina.
Derry abriu o teto solar, observando como as trevas haviam tomado completamente o céu, estendendo, feito mortalha, o manto até à terra cobrindo árvores, formando figuras medonhas ou garras que pareciam dispostas a agarrar qualquer transeunte distraído – embora àquela hora fosse pouco provável encontrar alguém na rua, se nem carro havia na estrada, quanto menos pessoas na calçada.
Além do vento frio que adentrou o carro, uma grande quantidade de nevoeiro também aproveitou a brecha, arrepiando-lhe todos os pelos, do pé do ouvido até o calcanhar, daí Derry percebeu o tamanho da péssima ideia que teve, então, rapidamente fechou a abertura.
O escuro começou a adquirir tons acinzentados, parecendo recuar por de trás da névoa que ficou cada vez mais densa, tornando difícil enxergar o estava pela frente.
Graças ao sensor, o farol de xenon ligou, possibilitando maior visibilidade, pelo menos do que estava por vir, enquanto o carro parecia ser devorado lentamente pelo vapor opaco e frio feito a morte.
Derry olhou pros lados, a impressão foi estar carregando o nevoeiro, sentiu-se o próprio Caronte, levando notícias de malfado – talvez ficar oculto na neblina não fosse assim tão ruim, mas ele não podia desligar os faróis e arriscar sofrer algum acidente…
— SKREEEEEETCH! – Os pneus cantaram alto, enquanto desviavam o carro pro meio-fio, numa tentativa de Derry escapar do luz forte surgida assim que voltou os olhos pra frente.
Distraído com o clima, embalado pela quietude, esqueceu a encruzilhada a frente – o silêncio pode esconder surpresas assustadores, até mesmo mortais, ainda mais com a ajuda da cerração.
Sem poder enxergar, devido à luz incandescente que lhe atingiu a retina, Derry estacionou o carro, antes de algo acontecer e esperou a visão reestabelecer, massageando os olhos que lacrimejaram, doloridos.
Esse era o motivo porque não gostava de sair a noite, quando escurecia a retina ficava sensível a qualquer estímulo de luz, por isso programou pra iluminação do flat ficar baixa, além de usar o modo escuro no celular e um app que reduzia ainda mais o brilho da tela do iPhone.
Gradualmente a visão foi retornando e ele olhou em volta, sem poder reconhecer nada ficou assustado, só podia ter se perdido e a culpa era toda daquele maldito nevoeiro. Pelo retrovisor deu pra ver nada, nem a própria imagem foi refletida ali.
— Melhor me mandar daqui, o clima tá nada receptivo. – Então Derry botou o endereço de Adie no Waze, deu partida e pisou no acelerador, só aí se deu conta que estava descalço.
— Nossa! Saí tão rápido que nem percebi isso. – Só que agora estava longe e talvez fosse ainda mais difícil voltar que continuar, fosse onde é que estivesse.
Mesmo com as orientações do app, continuar o trajeto ainda foi bem difícil, a neblina parecia cada vez mais densa e, com receio de ser surpreendido por outro veículo ou bater em algo, não conseguiu desgrudar os olhos da estrada.
A possibilidade de bater em algo era a mais remota possível – o carro era lotado de sensor, mesmo assim ele preferiu redobrar a atenção e dirigir com cautela, conduzindo o carro numa velocidade menor.
Um terror inexplicável, pareceu desprender do ar, impregnando na pele cada vez que ia mais fundo na cerração, a ponto de fazer disparar a sensação que algo bem ruim estava pra acontecer a qualquer momento e que isso podia vir de qualquer lugar – a paranoia só não piorou porque a luz dos faróis impediam do carro ser totalmente tomado pelo assustador vapor branco.
Mas o desejo de sair logo dali incomodava cada vez mais, algo nele berrava pra fazer a conversão e voltar logo pra casa, enquanto outra voz dizia que devia continuar em frente e o mais rápido possível pra descobrir o que tinha acontecido pra ser chamado com tanta pressa.
— Que será que aconteceu? – Ele começou a refletir.
Não dava pra saber, mas devia ser algo sério pra Deepak insistir dele aparecer uma hora daquelas.
— Faz tempo que a gente não se fala. – Depois que ele e Adie marcaram de sair, acabaram nem conversando mais, daí passou maior tempo e nada de Adie entrar em contato.
Derry evitou imaginar quais seriam as possibilidades pra ser chamado com tanta urgência, pois os pensamentos que ameaçavam tomar a mente se mostravam os mais perturbadores possíveis, como se algo na atmosfera estivesse a corromper tudo, impedindo até mesmo a luz brilhar dentro da cabeça, imprimindo tragédia no que viesse a pensar.
A tela do iPhone mostrava ainda faltar vários quilômetros e, pra piorar, o percurso estava ficando cada vez mais difícil, o caminho enevoado fazia parecer que o céu tinha descido à terra, mas a sensação desprendida era nada boa, enchendo tudo de aflição, dando a impressão que o espanto noturno que espreitava de todos os lados, aguardando apenas a melhor oportunidade pra atacar.
O suor começou a escorrer pela testa de Derry, as mãos ficaram pegajosas, tornando perigoso controlar o volante, então ele ativou o piloto automático, enquanto a camisa e até o roupão encharcavam.
Um vento gelado começou entrar pelo ar-condicionado, embora ele estivesse desligado e o envolveu, ao contato com o suor, um arrepio tomou conta dos braços, peito, tórax, cabeça, até chegar na espinha.
Apesar do frio, o suor fez aumentar, tanto que ele se viu obrigado a atirar o roupão de lado e remover a camiseta, deixando de fora os músculos bem desenhados na pele alva.
Só depois de fazer isso o suor deu trégua, mas o frio não diminuiu – o estranho é que a medida que a pele esfriava, ao invés do queixo bater e os tremores se manifestar, o que sentiu foi certo conforto.
A medida que o carro se aproximava do destino, respirar se tornou mais complicado, como se ele seguisse montanha acima, o ar ficou cada vez mais rarefeito e ele sentiu cansaço e, enquanto as forças deixavam o corpo a cada trecho ficado pra trás, uma forte sonolência se abateu sobre ele.
Os olhos ficaram cada vez mais pesados, Derry precisou usar bastante força pra mantê-los abertos, embora estivesse ficando cada vez mais fraco, nisso o excesso de energia exigido pra manter-se desperto diminui a capacidade de respirar.
Ao olhar o Waze, faltava apenas alguns metros, então Derry segurou o volante com firmeza, reassumindo a direção e pisou fundo, independente do que podia acontecer ele ia continuar em frente e chegar lá.
— Você chegou ao seu destino! – A voz surgida de repente o pegou total desprevenido, causando maior susto que o fez frear com tudo, o som dos pneus cantando no asfalto o demoveu do estado de letargia e ele ficou alerta, a respiração voltou ao normal e o vigor também retornou.
Mas antes ele tivesse continuado como estava, ao desligar o carro, um zumbido extremamente agudo soou e ele colocou as mãos nos ouvidos, tentando protegê-los daquele som horripilantemente doloroso que parecia querer lhe perfurar a cabeça.
Derry começou a se tremer, como se se duplicasse cada vez que se movimentava, enquanto um som gutural escapou-lhe, soando tão alto que podia ser ouvido até mesmo na montanha que ficavam perto dali, fazendo nefastos pássaros noturnos levantar despertar, revoando pelo escuro céu.
Foi então que tudo mergulhou em silêncio, a não ser por um urro potente como rugido de leão ferido terrivelmente. Ao se dar conta que o som vinha de si mesmo, Derry fechou a boca e o clima de suspense dominou o espaço físico a sua volta.
Ao abrir a porta, a névoa havia dispersado, permanecendo apenas no chão, era como se a estrada tivesse sido tragada pelo vapor condensado, desfazendo-se em gás. Ainda receoso, Derry pôs os pés no chão, felizmente havia firmeza ali, embora não pudesse ser visto, o solo parecia ainda permanecer ali.
Aliviado, ele ergueu os olhos, mas tudo que enxergou foi um imenso matagal a frente dele.
— Onde foi que o Waze me jogou? – Ele estava espantado.
Mais essa! Depois de tudo que passou pra chegar, o app tê-lo enviado pra um lugar desconhecido e ainda mais assustador do que o que estava antes.
Derry pegou o iPhone, mas o app apontava que aquele era o lugar correto, ele reviu o endereço e o trajeto, mas tudo estava certo.
— Caramba! Que lugar é esse!?
Derry olhou ao redor, buscando reconhecer algo, havia várias casas em volta, mas todas decrépitas ou em avançado estado de decadência. Os olhos assustados não conseguiram compreender o que estava acontecendo, ainda assim tentou encontrar algo que desse sentido àquilo.
Foi aí que começou a reparar na casa da frente ao matagal, uma sensação déjà vu lhe assomou a mente de maneira tão intensa que até tontura causou e ele precisou firmar os pés no fosse no que estivesse pisando sob a névoa. Quanto mais se aproximava do portão, maior a impressão de reconhecimento, foi aí que um insight o fez reconhecê-lo.
Derry sabia bem de quem era aquela casa, depois de ser denunciado pra polícia, a imagem da vizinha de Adie fechando aquele portão ficou fortemente gravada em sua mente.
— Não pode ser! – Ele soltou, espantado.
Algo tinha de estar errado ali, fazia apenas alguns meses que ele tinha se afastado pensando nunca mais retornar àquele local, mas o estado que a rua e as casas se encontravam pareciam ter sido abandonadas a tantos anos que se quer dava pra contar nos dedos.
Novamente ele encarou o matagal, se a lógica estivesse certa, ali era a casa de Adie. Derry desceu alguns metros pra direita, onde iniciava a rua, e verificou a placa informativa, o nome constado ali era exatamente o mesmo que o Waze indicou, que ele havia escrito e que lembrava ser o endereço de Adie.
Não tendo mais como levantar questionamentos, apenas aceitar a cruel e totalmente estranha realidade dos fatos, ele voltou até o carro, trancou a porta e ficou encarando a imensidão de mato onde um dia tinha sido a casa de Adie.
— Como é que vô passar por isso? Vai saber que bang tem aí nos mato?
A mente estava uma bagunça só, enquanto tentava sobrepor as informações já registradas com toda estraneidade recém captada pela visão, ainda assim ele conseguiu recordar do canivete suíço que sempre carregava – afinal, Derry nunca sabia qual a situação em que podia se encontrar.
O diferencial é que ele era cheio de ferramentas, com lâminas de um material extremamente resistente, além de bem afiadas – justificando o preço exorbitante pago nele.
— Isso deve servir! – Derry encarou o canivete que pareceu sorrir, finalmente ele ia entrar em ação.
Ele ascendeu a lanterna do iPhone, prendendo na corrente do pescoço, daí seguiu fazendo rápidos movimentos, de cima pra baixo na diagonal, formando um X. A lâmina era tão precisa que bastava um toque pros matos cair sem vida, abrindo caminho, assim ele foi desbravando rumo ao desconhecido.
Apesar do mato ceder facilmente, parecia não ter fim, quanto mais Derry cortava, mais havia o que tirar do caminho – felizmente ele não encontrou nada além da grama alta e teimosa.
Em dado momento, Derry começou a sentir cansaço, toda aventura inesperada somada ao dia puxado que teve no serviço pesou-lhe a cabeça, fazendo todo corpo querer ceder.
Olhando pra trás, ele viu que a mata fechada, como se nem tivesse sido atravessada pela lâmina do canivete, cedendo o corpo foi ao chão e ele caiu sentado.
O desânimo lhe invadiu a mente e Derry foi ficando triste, sem esperanças. Já estava perdido, que mais de ruim faltava acontecer? – pelo menos ele não chegou a proferir isso, apenas aceitou as palavras sopradas por um vento gelado que lhe arrepiou a espinha.
A bad lhe apertou o coração e Derry foi ficando cada vez mais desanimado, enquanto um pesado sono ia se apossando do exausto corpo. Obediente, ao cansaço, ele deitou na grama.
Não havia mais o que fazer, todos esforços pareciam ter resultado em nada, melhor era fechar os olhos e se lançar no sono, desconhecido, mas sedutor, prometendo descanso de todo aquele pesadelo.
Quando os olhos de Derry fecharam, tudo escureceu, submergindo num profundo silêncio, então toda dor e cansaço físico e mental desapareceu, o corpo ficou leve, como se estivesse a se desfazer com o sopro do vento, enquanto ele mergulhava no lugar calmo prometido pelo sono.
#proximoepisodio
Após muito relutar, Derry acaba cedendo a um profundo sono, de onde nunca mais ia acordar, mas algo o desperta e ele percebe que precisava prosseguir com a missão – ele só não sabia tudo que ainda ia ter de enfrentar pra provar seu valor.
Ele terá que lutar com todas as forças contra si mesmo, enfrentar os maiores medos pra que um beijo de amor verdadeiro traga de volta a garota mais linda e meiga que já conheceu.
Ósculos e amplexos,
Autor de Interrompido – A curva no vale da sombra da morte, é um cara apaixonado total por música, se deixar não faz nada sem uma boa trilha sonora. Bota em suas histórias um pouco de seus amores e do que sua visão inversível o permite enxergar da vida.